Locaweb Edição 92

entrevista 12 REVISTA LOCAWEB Se eu não me vejo, não compro De acordo com o Banco Interamericano de Desenvolvimento, essa parcela enorme da população reúne cerca de 11 milhões de empreendedores. Isso significa que os negros formam o maior grupo de donos de negócios no Brasil, liderando o ranking, com 38,8% dos empreendimentos. Logo em seguida, os brancos ocupam 32,9% do mercado, segundo o Global Entrepreneurship Monitor (GEM) 2017. Esses números, em uma realidade perfeita, seriam o retrato de um cenário muito bem-sucedido de oportunidades para todos. Entretanto, os empreendedores negros ainda são os que menos conseguem empregar e gerar lucro para suas empresas. A situação se mantémmesmo com a outra ponta, o consumidor, pronto para comprar. A pesquisa Diversidade no Mercado de Consumo e Empreendedorismo mostrou que 98% dos negros dão preferência a produtos e serviços com temática próxima à realidade em que vivem. De quebra, quase metade dos entrevistados respondeu estar disposta a pagar mais para ter um produto que valorizasse elementos da cultura afro. Dentro de um contexto de desequilíbrio, o Movimento Black Money surgiu para ser um agente de desenvolvimento e consumo integrado a esse ecossistema. A iniciativa trabalha para estimular o espírito inovador de empreendedores e jovens negros. A ideia é empoderar as pessoas e inseri-las em uma rede de conexão com a comunidade negra para estimular o afroconsumo e ampliar sua presença nas empresas e em outros espaços de negócio. O Movimento Black Money também nasceu para reforçar a importância e estimular o uso do poder de compra para investir no afroempreendedorismo. As estatísticas mostram que tem muita gente empreendendo e querendo consumir dentro desse mercado. “O objetivo agora é fazer com que o dinheiro circule por mais tempo dentro da própria comunidade negra”, explica Nina. Mais negócios Logo nos primeiros anos, a iniciativa deu frutos e inspirou ainda a criação da fintech D’Black Bank (www.dblackbank. com.br) . A startup de finanças conecta consumidores a empreendedores negros e fornece uma gama de serviços financeiros totalmente digitais. A ideia aqui é estimular a emancipação da população negra do País e fomentar a inovação por meio de desburocratização, taxas mais justas e melhores condições de crédito. E olha que essa é apenas uma das ideias que Nina pretende colocar em prática. Uma das 100 pessoas afrodescendentes mais influentes do mundo e uma das 20 mulheres mais poderosas do Brasil. Por trás desses números, conte-nos: quem é Nina Silva? Eu sou filha de Seu Antônio e Dona Maria, nascida no Jardim Catarina, um bairro de São Gonçalo, no Rio de Janeiro. Durante toda a infância, eu sempre fui uma criança plural. Gostava de matemática, português, literatura, fazia esportes. Tudo isso em ummundo que era totalmente one task, no qual você só podia ter um foco, um perfil específico. É por isso que, hoje em dia, quando eu vejo a transformação digital e como as pessoas têm, o tempo todo, dado valor e fomentado os profissionais de diferentes perfis, fico muito feliz. Vejo que eu não era uma criança tão problemática assim, muito pelo contrário. Você sempre teve dificuldade de se ver incluída nos espaços em que estava? Sempre me senti muito fora de todas as coisas. Estudei como bolsista em um colégio pago de classe baixa, onde minha irmã mais velha estudava. Depois, me formei em Administração na Universidade Federal Fluminense, na turma de 2004 e, na sequência, me especializei em sistemas da informação. Mas minha carreira começou para valer em 2002, como trainee, e passei a atuar como consultora junior no ano seguinte. Atuei seis anos como consultora e, entre 2007 e 2008, me tornei líder de frente para gestão de pessoas, também em tecnologia. Desde então, gerenciei uma série de times, sempre de maioria branca e masculina. Quais foram as principais dificuldades de aceitação que você enfrentou durante esse período? Tive muitos problemas para entender por que não conseguia me ver ali. Mas o fato é que não observava pessoas iguais a mim nos lugares que frequentava. Minhas qualificações me levaram para muitos espaços internacionais desejados, tive a oportunidade de morar fora, fiz trabalhos de implementação em diferentes países. Estive em times de gigantes, com dezenas de pessoas, e sempre me questionei por que elas não podiam ter a mesma aparência que eu. A questão racial sempre foi muito forte. A não presença de profissionais negros nos espaços de tecnologia ainda é muito impactante. Como você superou essas dificuldades para se tornar uma profissional bem-sucedida? Debrucei-me totalmente sobre a minha carreira. Mas, em 2013, num cargo de gerente de sistemas, tive um burnout (nota da redação: estado físico, emocional e mental de exaustão extrema, resultado do acúmulo de situações de trabalho emocionalmente muito estressantes, que leva a um Fui atrás de um lugar para sentir que o meu trabalho estava realmente sendo valorizado, onde as entregas não seriam apenas burocráticas A questão racial sempre foi muito forte. A não presença de profissionais negros nos espaços de tecnologia ainda é muito impactante

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