Natureza - Edição 331

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editorial
Dosesmaciças
de Natureza
E le escutou a minha história e me olhou com aquele olhar
que só os médicos têm quando desconfiam que o problema
vai além do físico. Sentenciou: “Você precisa escrever
menos e praticar mais jardinismo”.
Gostei do remédio. Não era nada grave, só umas coceirinhas
chatas, reflexo do estresse cotidiano. Mas, como levo a sério o
que os médicos dizem, resolvi reforçar minha dose diária de
jardinagem e paisagismo.
Bom mesmo é quando estou no campo e posso me enfiar por
dias inteiros plantando, regando, descansando meus olhos pelas
flores de arundinas, ipês – a florada dos ipês-roxos está demais
neste inverno – ou acácias. Saio de lá como se tivesse 15 anos
novamente, pronto para o que der e vier.
Amaior parte do tempo, porém, estou em São
Paulo. Meu quintal é aAvenida Paulista, de todas
as tribos e cores. Como cada um vê o que gosta,
pouco olho para o asfalto e o cimento. Conheço
todas as árvores de todos os parques da região.
Dou sempre um oi para o amor-agarradinho
que enfeita um restaurante perto da minha casa,
e acompanho de perto as algazarras que fazem os
sanhaços-azuis na sibipiruna em frente à minha janela.
Às vezes, passeio com amigos. Uns veem carros, eu vejo
tipuanas. Outros admiram vitrines, eu me empolgo com a floração
dos manacás. Há quem coloque fones de ouvido para ouvir rock, ou
rap, mas eu prefiro distinguir o canto do sabiá.
Tenho até ordens médicas para fazer isso. O santo remédio que
a Natureza inventou para sossegar os espíritos – e evitar coceiras
– é não temer o futuro e ficar ao sol como as plantas e as flores,
na grande festa colorida da vida. Ah, muito importante: para esse
medicamento não há contraindicação.
Roberto Araújo
Juan Esteves
Valerio Romahn