Kotaro Hayashida prefere o anonimato. É por
isso que ele adotou o pseudônimo Ossahle
Kohta, como é creditado emvários dos
jogos dos quais participou, e sempre evitou
registros fotográficos. O game designer entrou
na Sega e se tornou essencial na produção
de grandes clássicos da empresa – como o
próprio
Alex Kidd
e o clássico RPG
Phantasy
Star
, do qual foi responsável pelo roteiro. Sua
ludografia inclui também
My Hero
(
Gang’s
Fighter
por aqui),
Ninja Princess
,
Zillion
e
Space Harrier II
, só para citar alguns. Kotaro
concedeu depoimentos ao site da Sega of
Japan, ao livro
SegaMega Drive Collected
Works
e ao encarte do álbum
Alex Kidd
Complete Soundtrack
, usados como fonte para
esta reportagem. Aqui vãomais alguns deles.
O que você fazia antes de entrar na Sega?
Você sempre quis trabalhar com jogos?
Mudei-me para Tóquio assimqueme formei
na Faculdade de Direito – que, claro, não
temnada a ver comvideogames. No fimdas
contas, foi meu hobby que prevaleceu. Eu
pretendia trabalhar na Namco, mas acabei
sabendo antes que a Sega estava comuma
vaga emaberto. Quando vi a propaganda em
uma revista de que a Sega estava recrutando
novos funcionários, no dia seguinte peguei
um trematé a empresa. Só que omapa que
eu tinha era bem complicado e acabei me
perdendo nomeio do caminho, indo parar em
uma fábrica da companhia. Um funcionário da
Segame deu uma carona ao edifício principal
e consegui fazer a prova e a entrevista. E,
por incrível que pareça, elesme contrataram
nomesmo dia. É o tipo de coisa que jamais
aconteceria atualmente, mas era assima
indústria naquela época. Na verdade, também
haviamarcado uma entrevista na Namco, mas
comome ofereceramo emprego na Sega,
decidi aceitar logo de cara.
Qual foi o seu primeiro jogo na Sega?
Fui contratado em 1983, assimque eles
começarama desenvolver jogos para
consoles. Éramosmais oumenos dez
pessoas no setor de sistemas domésticos,
que começou fazendo jogos para SG-1000
[primeiro videogame da empresa, lançado em
1983]. O primeiro jogo no qual trabalhei se
chama
Hustle Chumy
, eu acho.
Na verdade, começamosmesmo
produzindo um jogo de arcade. Até fizemos
um teste de locação, mas acabou que o
projeto foi engavetado. Ele se chamava
Chain Pit
. Pensando bemhoje emdia, parece
uma loucura o fato de umbando de novatos
planejar e lançar um jogo assimde primeira.
O design do jogo era diferente no início?
Sim. O primeiro nome que demos ao game foi
Alex Kidd inMiracle Land
[emvez do título final
Alex Kidd inMiracle World
], mas planejávamos
desde o início fazer umadventure com
elementos de ação. Algo semelhante ao que
chamamos hoje emdia de ‘RPG de ação’.
Mas os comandos envolviamos ataques de
Alex comsocos e pulos?
Não. Originalmente, ele usava umbastão
como arma, mas então o transformamos
emumdiscípulo de Kenpou, e ele virou um
personagemmais original, como soco sendo
a arma principal. E esse ataque foi uma das
coisas que fizemos para diferenciá-lo do
Mario. Houve váriasmudanças assimdurante
a produção e o design do jogo teve várias
revisões até chegar à forma que conhecemos.
Que outros elementos vocês utilizarampara
distinguir o jogo de
Super Mario Bros.
?
Por exemplo, Mario ataca para cima quando
ele pula, então Alex desfere seus golpes
lateralmente. Coisas assim. Aliás, também
trocamos a ordemdos botões de pular e
atacar em relação ao
Mario
. Na época, a gente
achava que estava fazendo algo ‘diferente’...
Lego engano. Quando olho agora, não faz
sentido algum. E émais difícil jogar assim.
Como foram criados Alex e oMiracleWorld?
Pedi a umdesenhista que criasse o Alex. Não
sei se foi uma ideia dele, inclusive, masmuitos
dizemque o personagemficoumuito parecido
comigo. Eu não tinha um conceito definido
para o design dos gráficos, mas criava alguns
desenhos que serviam como conceito e
descrição do cenário. O resultado final ficou
apátrido, sem referência a qualquer lugar
conhecido, emanteve o visual fantasioso.
O jogo é situado emoutro universo, mas a
comida favorita do Alex é umonigiri, que é
da nossa cultura. Qual a explicação?
Sim, o bolinho de arroz é uma comida do
nosso planeta, mas existe uma ilha emAries
comamesma culinária [risos]. Não sei dizer
quando Alex começou a gostar de onigiris,
mas seu pai King Thunder gosta de absorver
novas culturas, então provavelmente foi ele
que apresentou os bolinhos ao Alex. [Na
versão ocidental de
Miracle World
, os onigiris
foram substituídos por hambúrgueres].
Aliás, por que as lutas contra os chefes são
partidas de pedra, papel e tesoura?
Esse foi umdaqueles conceitos que criamos
para diferenciar nosso jogo do
Mario
. Era
uma ideia absurda. Tivemos várias reações
tipo: “Como assim? Isso não era pra ser um
jogo de ação?” ou “Perdi o Jankenpo e agora
deu Game Over? Que porcaria.” Realmente,
para osmais habilidosos, perder tudo em
uma partida de pedra, papel e tesoura… É
uma drogamesmo [risos]. O pessoal da Sega
ficou preocupado, mas eu queria ver como os
jogadores reagiriam, então deixei no jogo.
Como você avalia atualmente
MiracleWorld
?
É um jogo bem carismático, emque você
procura explorar cada canto. Mas acho que
deveria ter feito algomais amigável…Deveria
aomenos deixar os jogadores visualizarema
pontuação o tempo todo [risos]. E gostomuito
até hoje da ideia por trás do Peticopter. É por
isso que, quando faço o design de um jogo,
sempre tento colocar uma certa variedade de
veículos. Fiz vários deles em
Phantasy Star
,
por exemplo, no qual trabalhei bemdepois de
Alex Kidd
. E, apesar da aparência infantil,
Alex
Kidd
é um jogomuito difícil, cheio de desafios.
Por isso, acho que todos que jogaram
deveriamestar possuídos de uma rara
paciência e perseverança (alémde uma certa
generosidade, considerando o número de
coisas absurdas no jogo). Mas acho que foram
os obstáculos horríveis que o jogo tinha que
fizeram comque ele fosse tão inesquecível.
Só recentemente descobri que Alex Kidd é um
personagembem conhecido na Europa, até
mesmo hoje emdia. Fico bem surpreso e feliz
de saber que Alex Kidd foi jogado por várias
pessoas ao redor domundo.
Enfim, era uma épocamuito boa. Pramim,
Alex Kidd inMiracle World
foi minha primeira
oportunidade de construir ummundo cheio
de fantasia, que antes disso existia apenas na
minhamente e de forma nublada e desconexa.
Quando vi minhas concepções transformadas
em realidade na tela do jogo, senti uma alegria
que não trocaria por nada nestemundo.
Kotaro Hayashida, o recluso criador de Alex Kidd
*Agradecimentosaositeshmuplations.compelaajudanatraduçãodestaentrevista.
(Reprodução/World of PhantasyStar)
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Alex Kidd in Miracle World